
Na história do renascimento da cultura africana no Brasil, dois fatos se destacam como precursores da Umbanda. Um deles foi o costume dos escravos de se reunirem após o horário de trabalho para dançar e cantar suas músicas tradicionais; essa prática, ao se difundir como forma de culto religioso em terreiros e áreas ermas, ficou conhecida pelas autoridades pelo nome "Macumba", termo que, de simples designação do local das danças, passou a ter o sentido pejorativo de magia negra e orgia. o medo das macumbas era forte entre os senhores e as autoridades, pois a religião africana, em suas mentes, estava indissoluvelmente ligada a feitiços destinados a vingar os escravos e a destruir seus opressores. Por isso, durante muito tempo, essa religião foi violentamente reprimida pela polícia, só começando a se libertar a partir do final do século 19, quando, ao ser lentamente absorvida pelas classes médias urbanas, foi depurada dos aspectos ameaçadores e adaptada à concepção de mundo do espiritismo racionalista recém-posto em moda na Europa. A partir dessa época, é que a religião passou a adotar o nome de Umbanda, derivado do termo Banto "Mbanda" que designava o sacerdote de sua religião.
Outro fator importante para a formação da Umbanda foi a criação, desde o século 18, de Irmandades Religiosas Católicas destinadas a dar assistência aos escravos. O próprio clero católico, assim como já fizera com os índios em seu trabalho de catequização, estimulou a superposição entre os deuses africanos e os santos católicos, já que seria importante, para a aceitação da nova crença, que os africanos reconhecessem as semelhanças entre os dois grupos de divindades. Começando com Jesus Cristo e seu oposto Satanás, com a Virgem Maria e os santos protetores das Irmandades, aos poucos foi se formando um panteão alternativo extraído do catolicismo popular e constituído, de início, pelas figuras que atendiam às necessidades mais urgentes dos escravos. Desta forma, São Jorge era o guerreiro necessário para apoiá-los em suas lutas e São Lázaro intercedia por suas doenças, assim como São Pedro exercia sua justiça e Cosme e Damião protegiam as crianças.Entretanto, foi ao se combinar com o esoterismo europeu que a Umbanda tomou sua feição particular. Para começar, afastou-se da forma original do culto dos Orixás, do êxtase das danças rituais, e se aproximou da prática da mediunidade exercida para fins de caridade típica do espiritismo. Na tentativa de legitimar sua religião, fazendo com que ela deixasse de ser um "caso de polícia", os Umbandistas buscaram transformá-la numa religião de caráter universal, que, além de africanos e ameríndios, também tivesse um espaço garantido para todos os povos da Europa, da Ásia e das Américas. Baseando-se no modelo da Cabala e da magia européia, foi elaborado um sistema hierárquico extremamente complexo, que tem no alto sete Santos (Orixás sincretizados com algumas das figuras mais importantes do Catolicismo no Brasil) que são chefes de Linhas, e a cada um dos quais estão subordinadas legiões e falanges de espíritos protetores: santos, crianças, almas, caboclos, sábios, etc.
O rito da Umbanda é muito mais simples do que o do Candomblé. Após o processo de iniciação, que é mais a criação de um vínculo forte com o culto do que um longo aprendizado, o fiel participa das cerimônias em que cantos simples, geralmente em português, chamam os Santos que usam o corpo de seus "cavalos" para conversar com os assistentes, dar conselhos e realizar curas. Por ter essa finalidade de aliviar os problemas cotidianos das pessoas comuns, a Umbanda é muito popular em todas as classes sociais e entre grupos das mais variadas origens. Um traço importante da Umbanda é o estímulo ao desenvolvimento da intuição e até da prática pessoal do culto, quando não houver possibilidade de frequentar um centro religioso.
Os ritos da Umbanda têm fortes marcas da magia européia, tanto mais fortes quanto mais nos dirigimos para o Sul do país, onde a presença das raízes africanas é cada vez mais fraca. Para começar, o contato com os mortos (os "Encantados", ou seja, mortos que se tornaram espíritos protetores) é muito mais importante do que o culto das divindades; aliás, todas as antigas divindades africanas são vistas aqui como Orixás subordinados ao Deus único que é Oxalá. Ritos de purificação com água, incenso e sal são essenciais; as velas simbolizam a luz necessária às almas e a energia mágica. Os oráculos mais usados são os Tarôs e baralho cigano. Para resolver seus problemas, os fiéis podem procurar os "Encantados" (entidades) que lhes darão passes ou usarão outros meios mágicos; ou podem recorrer a orações, oferendas e feitiços diversos. Até mesmo os mitos fundamentais sofrem este efeito: enquanto, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais e entre grupos com forte ascendência negra, ainda é encontrado na literatura da Umbanda o reconhecimento de suas origens africanas, nas regiões e camadas sociais que não tiveram o contato direto com este elemento foi criado um mito alternativo que pretende redefinir a Umbanda como uma religião originária dos mais antigos mitos europeus, numa tentativa de universalizá-la e garantir sua legitimação diante de camadas mais amplas (e poderosas) da sociedade.
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