segunda-feira, 28 de julho de 2008

Quimbanda


Este talvez seja o campo do sincretismo afro-brasileiro que mais se presta a confusões. Para os observadores apressados ou preconceituosos, é simplesmente a magia negra, o domínio do mal e do diabo; entretanto, os que olham com respeito para as crenças alheias sabem que a realidade não é bem assim.
Quando os Iorubás ainda viviam na África, o culto dos Eguns (os mortos) era um setor separado da religião comum, com um clero particular, lugares próprios de culto e ritos peculiares. A presença dos ancestrais entre os vivos era considerada um fato ameaçador e o objetivo do culto dos Eguns era acalmá-los e afastá-los para seu lugar próprio. Já entre os Jejes do Daomé, a presença dos mortos era mais familiar. Seus Voduns se dividiam em três famílias: os do Raio, os deuses celestes, como Lissa e Sobô, equivalentes a Oxalá e Xangô; os da Terra (ligados a Buruku e Bossuko, que são Nanã e Omolu); e os Ancestrais, que são principalmente os reis que se tornaram espíritos tutelares. Os povos Bantos também tinham uma grande familiaridade com o culto dos mortos, com a Calunga (o espírito do morto e o cemitério) e os Zumbis (espíritos benignos ou malignos, escravos de Lã Baru, o senhor da terra).
A forte divisão entre bem e mal que o pensamento cristão implantou nas crenças sincréticas brasileiras dificultou a coexistência entre os santos e os mortos comuns; por isso, os dois cultos se separaram. Exu, o vigoroso Orixá da vida e da sexualidade, já fora associado, pelo clero católico, ao diabo cristão; e Omulu, senhor da terra, conservou seu caráter ameaçador de Deus da doença e da morte. Estes dois Orixás, nos cultos sincréticos, passaram a ser vistos como os senhores do reino da morte e do mal. Quando a Umbanda elaborou seu sistema de falanges de santos e caboclos, foi criado um sistema semelhante correspondente ao "outro lado do espelho", ou seja, ao mundo dos cemitérios e Exus. Cada um dos dois se tornou cabeça de uma falange: a de Atotô (Omolu), formada pelas falanges do povo do cemitério; e a de Exu, formada pelas falanges de Exus que servem aos Santos das falanges de Umbanda e que constituem o povo das ruas.
Os cultos também se separaram. Enquanto as linhas dos Santos, Caboclos, etc., são chamadas para participar das sessões comuns de Umbanda, as linhas de Quimbanda só comparecem na "virada da banda", que, frequentemente, ocorre após a meia-noite, depois de se retirarem crianças e pessoas que não queiram participar. Esta sessão é cercada de cuidados, como, por exemplo, a volta dos Caboclos para fazer a limpeza espiritual do ambiente.
Como o povo das ruas e dos cemitérios costuma ter um comportamento mais agressivo e interesseiro, criou-se o hábito, entre pessoas pouco escrupulosas, de utilizar a Quimbanda para fazer o mal, vingar-se de desafetos e obter vantagens por meios pouco honestos. Entretanto, as pessoas que trabalham a sério com essas entidades sabem que elas podem ser boas protetoras de seus fiéis, como o Exu que guarda a porteira da casa. O fundamental é que o fiel não deixe de tratar e agradar a esses povos, pois, como crianças mimadas, eles podem fazer uma bobagem em troca de um presente, mesmo que o mal depois volte para atacar aquele que o desejou para outros.
Na verdade, tratar seus Exus, ou seja, seu lado agressivo e impulsivo, é tão importante como tratar os aspectos mais abstratos de sua cabeça. A Quimbanda lida com dois aspectos fundamentais da nossa vida, que são a liberdade e a sexualidade. Usar esse trabalho para o mal é uma atitude que só pode ser tomada por pessoas cuja mente é distorcida e doentia.

Um comentário:

  1. Será que vocês não poderiam colocar no blog algumas simpatias, ou mandinguinhas pra gente fazer em casa?

    Obrigada

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