quarta-feira, 30 de julho de 2008

Catimbó

Talvez seja a mais democrática e universal de todas as práticas mágico-religiosas afro-brasileiras. Suas crenças e seus ritos resultam da mistura de elementos das tradições africanas, ameríndias e européias, com destaque especial para as práticas de feitiçaria e métodos de cura. O Catimbó está espalhado por todo o país, mas sem uma estrutura institucional nem um corpo de doutrina rígido.
A base sobre a qual se formou o Catimbó é a magia popular européia, a chamada feitiçaria ou bruxaria tradicional. Sobrevivente das antigas religiões da natureza dos povos Celtas que habitaram a Europa antes da expansão do Cristianismo, a feitiçaria se conservou como um foco de resistência de antigas culturas matriarcais dentro da estrutura autoritária e patriarcal da sociedade cristã medieval. Nos povoados rurais e nas aldeias, as bruxas eram curandeiras, dominando os conhecimentos sobre as ervas medicinais; eram ainda parteiras e experientes em diversas técnicas terapêuticas eficientes. Mas sua função mais popular era a de fornecer poções e amuletos para resolver os pequenos problemas do cotidiano por meio de magia simpática.
Apesar dos esforços destruidores da Inquisição, essa tradição conseguiu sobreviver e ser transplantada para o Brasil. Aqui se combinou com práticas mágicas da religião Banto, que valorizava o contato com espíritos e gênios protetores, consultados a respeito de práticas curativas e de feitiçaria. Entretanto, todo esse conjunto de elementos negros e europeus se moldaram numa forma fornecida pelos índios.
Entre este, o pajé era o elemento religioso único capaz de ouvir os espíritos dos ancestrais e entender suas mensagens. Os instrumentos necessários ao transe religioso eram uma bebida alucinógena e o som hipnótico dos maracás. Estes dois elementos foram absorvidos pelos rituais sincréticos. O Catimbó manteve o uso da bebida indutora do transe, originalmente feita com a raiz da jurema branca ou negra (Acacia jurema ou Jurema Nigra); daí esse ritual se chamar "Mesa de Jurema".
Dada a importância dessa planta para o rito, criou-se todo um sistema de crenças em torno dela. A árvore da jurema se tornou análoga à Árvore da Vida de tantas mitologias, o eixo do mundo que liga terra e céu e em cujo corpo se organizam os mundos mortal e divino. No Catimbó, a jurema é a morada dos Encantados (espíritos dos mortos) que se tornaram, por seu saber, Mestres de Catimbó. Esse mundo, que é o Juremá, é dividido em Reinos, Estados, cidades e Aldeias, cada qual habitado e governado por determinados Mestres. O instrumento essencial do Catimbó é o cachimbo com o qual o Mestre fuma sua mistura de ervas preferida ou a que considera adequada para resolver o problema de uma pessoa. O método de magia e cura usado pelos Mestres de Catimbó é defumar a pessoa com a fumaça do cachimbo, enquanto recitam orações adequadas ao caso e executam os gestos rituais adequados.
O Catimbó é uma atividade mágica essencialmente prática: seu objetivo é sempre tentar encontrar soluções para os problemas imediatos das pessoas. Esses problemas geralmente envolvem a necessidade de curar uma doença, o desejo de atrair uma pessoa amada, a busca de sucesso e prosperidade, a vontade de afastar inimigos ou de eliminar mau-olhado ou feitiços, bem como de ter o "corpo fechado" contra acidentes agressões, doenças e feitiços.
O ritual do Catimbó se desdobra em três momentos. O primeiro é o da colheita da jurema, que só pode ser feita com licença do Mestre de Catimbó; após consagrar essa raiz colhida, com cantos e defumações, chega o segundo momento, que é o do preparo da casca da raiz macerada em água. Pronta e consagrada a poção, ela será usada no terceiro momento, que é a Mesa de Jurema. Num barracão onde há uma mesa com os materiais necessários, os participantes bebem a jurema e, depois, dançam e cantam até atingir o transe que permitirá a manifestação dos Mestres. Este ritual segue uma ordem determinada: após uma prece inicial, é chamado o Mestre que abre os caminhos para os outros (o que é bem semelhante à função do Exu no Candomblé). A seguir, são chamados Mestres dos vários Reinos e Correntes, já que eles têm características e funções diferentes: podem ser caboclos, ciganos, pretos-velhos, santos etc. e podem se especializar em curas, casamentos ou feitiços.
Os presentes fazem as consultas e os Mestres fazem o que julgam necessário. Terminado o trabalho, o Mestre que abriu é chamado para fechar a sessão e o trabalho é encerrado.
O Catimbó usa muitas orações em que os Mestres buscam apoio nos Santos do Catolicismo popular mais conhecidos por sua eficácia na resolução de cada tipo de problema; estas orações, feitas com toda a concentração, acompanham a benzedura e a defumação.

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